24 de novembro de 2015

O Ano Mais Violento

O Caminho do Bem

A Most Violent Year, Dir: J.C. Chandor, EUA/Emirados Árabes, 2014, 125min
IMDB: clique aqui
Trailer: clique aqui


Filme que foi elogiado por parte da crítica e completamente ignorado pelo Oscar 2015, O Ano Mais Violento se passa no inverno de 1981 em Nova York, período mais violento da história da cidade. Apesar do título, o filme não vai fazer uma análise sobre os problemas de violência, mas contar uma estória bem específica, de um empresário que tenta vencer em seu negócio de venda de óleo para aquecimento em meio a este difícil contexto (e pelas estatísticas que li, esse ano mais violento de NY não é muito pior do que tem sido a realidade de todas as cidades médias e grandes do Brasil atual).

Abel Morales (Oscar Isaac) é um imigrante latino que se fez sozinho à base de muito trabalho. Mas no momento em que busca uma grande expansão em seu negócio, se vê pressionado por vários lados: pelos frequentes assaltos a suas cargas e por seus motoristas que querem andar armados, por uma investigação do ministério público a seus negócios, pelo dono do terreno que ele negociou e não aceita a prorrogação de seu pagamento, pelos bancos que lhe negam crédito, pelos seus competidores que ele suspeita que são os responsáveis por roubar suas cargas e até mesmo pela esposa (Jessica Chastain), filha de mafioso que questiona seus métodos.

Esses conflitos que envolvem Abel e seu dilema moral entre seguir tentando ser correto ou de se deixar levar por toda a podridão que o cerca conduzem o filme. O roteiro tem seus problemas, pois há muitos diálogos desinteressantes, parece que o filme vai andando em círculos e que não se sabe bem onde vai chegar. A edição compromete ainda mais isso, fazendo um filme um pouco enfadonho. Há alguns momentos de muita tensão, mas a violência é mais representada pela sua ameaça do que por tiros e sangue jorrando na tela.

A direção de J.C Chandor conduz muito bem seus atores, que são o ponto mais forte do filme. Oscar Isaac e Jessica Chastain são dois dos atores mais talentosos de sua geração. Após muitos elogios da crítica com filmes mais artísticos, ambos agora se lançam em blockbusters, ele terá papéis de destaque em Star Wars e em X-Men e ela fez parte do elenco de Perdido em Marte (clique aqui para ler o pitaco) e estará em O Caçador e a Rainha de Gelo. Ela já foi indicada ao Oscar por sua ótima performance em A Hora Mais Escura, e ele, se seguir com boas atuações como essa e a de Ex-Machina (clique aqui para ler o pitaco), em breve estará disputando o prêmio. Completa o elenco outro bom ator, David Oyelowo, que foi esnobado pelo Oscar 2015 com sua boa interpretação de Martin Luther King em Selma (clique aqui para ler o pitaco). Em cena, todos entregam um ótimo trabalho.

Na parte técnica, há uma bela fotografia e uma ótima produção de época. Também as esparsas cenas de ação são bem conduzidas de forma realista, sem pirotecnias, efeitos especiais ou tiros pra todos os lados.

O Ano Mais Violento é um filme que exige uma certa disposição do espectador que não deve querer ver tudo explicado de forma rápida. Talvez o seu realismo seja tanto que faça o filme se parecer com a vida real, onde as coisas se desenvolvem lentamente, sem muita linearidade e de forma chata. Mas é um bom filme, especialmente pelos ótimos atores.

Nota: 7


17 de novembro de 2015

Aliança do Crime

Bandidos sem Scorsese

Black Mass, Dir: Scott Cooper, EUA/Reino Unido, 2015, 122min
IMDB: clique aqui
Trailer: clique aqui


Está correndo por aí a piada de que Aliança do Crime é um filme de gangsteres sem o talento de Martin Scorsese. Sem deméritos à esforçada produção, mas é por aí. 

O filme conta a história real de James "Whitey" Bulger (Johnny Depp), um dos criminosos mais procurados da história dos EUA, que conseguiu destruir todos os seus rivais e expandir sua organização criminosa graças à aliança que estabeleceu com um amigo de infância que se tornou agente do FBI, John Connolly (Joel Edgerton), pelo qual se tornaria informante do órgão em troca de imunidade.

Esses dois homens são bastante complexos. Bulger é um bom vizinho e um pai atencioso e, simultaneamente, um criminoso ambicioso e matador impiedoso. Connolly quer fazer seu trabalho como policial e destruir a máfia italiana, mas ao mesmo tempo quer ganhar as manchetes de jornal e também provar a seu velho amigo de infância que é um cara que merece respeito (ainda que o respeito que ele almeje seja o de um criminoso frio e sanguinário).

O roteiro e a direção não têm nada de especial, mas são bem feitos. Destaca-se a boa delimitação do recorte temporal, mostrando a ascensão de Bulger até a queda de seu esquema. Após isso, ele passou anos foragido, mas o filme somente cita o fato, já que este período é uma estória à parte. Interessante observar que o filme não mostra nenhum sinal externo de empoderamento de Bulger, que sempre se parece o mesmo. Sabe-se que ele cresceu por conta dos diálogos e nada mais. Isso é válido, na medida em que Bulger, como boa parte dos gangsteres bem sucedidos, controlam um império silencioso. Quem for assistir não deve esperar um filme de ação, pois não é disso que se trata. Há algumas cenas bastante violentas, mas as mais tensas são as que mostram somente ameaças.

O maior problema do filme é a péssima maquiagem de Johnny Depp. A careca é notadamente artificial, com os cabelos laterais parecendo de boneca. As lentes de contato azuis são ainda piores, atrapalhando a atuação, pois os olhos são um dos elementos mais marcantes em atuações cinematográficas. Os produtores poderiam ter relexado mais na caracterização e deixado Depp mais à vontade. Mas talvez Depp já esteja incorporando maquiagens pesadas à sua persona, em vista de suas constantes mudanças de visual.

Johnny Depp dessa vez pegou um papel menos caricato do que os que vinha fazendo (Jack Sparrow, Chapeleiro Maluco e Willy Wonka), merecendo a atenção da crítica. Ele vai bem no filme, mas não é um trabalho digno de estatueta do Oscar, como está sendo apontado. Apesar de caricato, prefiro sua performance no primeiro Piratas do Caribe (que lhe rendeu uma de suas 3 indicações). O verdadeiro protagonista é Joel Edgerton, que é um ator canastrão, mas aqui seus exageros interpretativos casam bem com seu personagem, que possui uma vaidade ímpar. Os demais atores vão bem, incluindo o ótimo Benedict Cumberbatch, em papel secundário.

Aliança do Crime é um bom filme de criminosos, que, mesmo sem Martin Scorsese, consegue contar bem sua estória, sobretudo em razão das atuações.

Nota: 6

12 de novembro de 2015

007 Contra Spectre

Desfecho Regular para a Fase de Craig como Bond

Spectre, Dir: Sam Mendes, Reino Unido/EUA, 2015, 148min
IMDB: clique aqui
Trailer: clique aqui


007 está de volta após sua melhor aventura, 007 - Operação Skyfall (não fiz o pitaco, mas daria nota 8).  E mais uma vez a estória busca revelar mais sobre a personagem mais constante do cinema, cujo nebuloso passado quase nunca tinha sido mostrado. No entanto, decepciona.

A trama começa com Bond resolvendo pendências deixadas pela falecida M. Aliás, o filme começa com um longo plano sequência muito bem realizado. A trilha que ele segue o leva a uma poderosa organização secreta, a Spectre, entidade que já tinha existido nos velhos tempos de Sean Connery como Bond. E também vai-se mais a fundo no passado de Bond e mostra a conexão havida em todas as estórias da atual fase de Bond, ligando Vesper Lynd, Le Chiffre, Greene e Silva.

No filme anterior vimos o louvável resgate de alguns elementos do universo Bond, como a reintrodução da secretária Moneypenny, do inventor Q, do Aston Martin e do retorno da música tema. Nesse, o resgate continua, mas, infelizmente, parece que quiseram resgatar o que Bond tinha de mais caricato e que foi alvo das ótimas paródias de Austin Powers. Estão de volta o exército de capangas uniformizados, o vilão com paletó de gola reta e Bond enfrentando 15 caras de uma só vez. Uma pena, pois nessa fase com Daniel Craig no papel principal, notou-se uma busca por um certo realismo (na medida do possível para a série, obviamente), em clara inspiração na série concorrente de Jason Bourne. Retoma-se, assim, o que houve de pior em filmes de Bond, especialmente nas fases em que o protagonista foi vivido por Roger Moore e Timothy Dalton.

Como sempre, os cenários e a fotografia do filme são muito bem feitos. Contudo, as cenas de ação tem a edição muito recortada, o que normalmente torna a cena cansativa para o espectador. O ótimo diretor Sam Mendes, aclamado pela obra-prima Beleza Americana e responsável pelo filme antecessor, perdeu um pouco a mão aqui, talvez por conta do roteiro que quis resgatar estes pontos fracos da série Bond.

Daniel Craig, ao que tudo indica, em sua última aparição como Bond, mostra-se completamente à vontade no papel, superando as críticas que fizeram quando foi escolhido por ser loiro, baixo e forte. A talentosa Léa Seidoux mostra sua versatilidade ao encarar uma bond girl muito feminina e sexy, papel diametralmente oposto ao que protagonizou no recente Azul É a Cor Mais Quente (clique aqui para ler o pitaco). E o fenomenal Christoph Waltz encarna o típico vilão sádico característico da série, não mostrando o seu melhor aqui, mas também não faz feio. E há ainda espaço para um capanga fortão e indestrutível, vivido pelo ex-lutador de luta-livre Dave Bautista, seguindo a tradição de Oddjob e Jaws.

E também cabe o destaque da música-tema, uma das piores da série, interpretada por Sam Smith em gritos agudíssimos (link aqui). A comparação com a exuberante Adele cantando o ótimo tema do filme anterior é imediata (link aqui). A propósito, clique nos links para ouvir algumas das melhores músicas da série: GoldfingerViva e Deixe Morrer (do mito Paul McCartney), Os Diamantes são EternosNa Mira dos AssassinosLicença para MatarO Amanhã Nunca Morre e Casino Royale.

007 contra Spectre perde a linha que estava sendo bem construída nessa nova fase. Faz bem em cavar mais a fundo a origem de Bond, mas erra ao incorporar os elementos mais caricatos das tramas anteriores. Uma melancólica provável despedida para Daniel Craig.

Nota: 5

10 de novembro de 2015

Ex Machina

Máquina do Amor

Dir: Alex Garland, Reino Unido, 2015, 108min
IMDB: clique aqui
Trailer: clique aqui


A Inteligência artificial levada à sério. Isso é o que se pode esperar de Ex Machina, filme britânico que, infelizmente, sequer passou pelos cinemas brasileiros, sendo lançado diretamente em DVD, e passando despercebido por boa parte da crítica e do público.

Assim como fiz no pitaco de Vingadores - Era de Ultron (clique aqui para ler), novamente sugiro aqui o ótimo texto do blog Wait But Why que trata dos computadores pensantes (clique aqui), que podem ser a maior revolução na História ou podem ser o caminho mais curto para a completa aniquilação humana.

Na trama, um programador de um grande conglomerado de buscas da internet (qualquer semelhança com o Google não é mera coincidência), Caleb (Domhnall Gleeson), é sorteado para passar um tempo com o dono da empresa, Nathan (Oscar Isaac). Quando chega ao local ele descobre que seu propósito de estar lá seria o de aplicar o Teste de Turing, que consiste em avaliar se uma máquina consegue se passar por humano (aliás, o brilhante Alan Turing ganhou recentemente uma cinebiografia bem meia boca, O Jogo da Imitação, clique aqui para ler o pitaco). No caso, de cara Caleb sabe que estará lidando com uma máquina, e o desafio será de buscar alguma inconsistência que ateste que a máquina não é uma mulher, como parece.

Uma das características mais notáveis na androide Ava (Alicia Vikander) é o fato de ter como uma de suas características o componente sexual. Aliás, qualquer um que queira criar uma máquina que se passe por humano não pode esquecer disso. Começa aí o jogo de sedução e manipulação entre Ava e Caleb, que deixa o protagonista completamente perdido com relação a todos os seus referenciais na vida.

O roteiro é denso e intelectualmente complexo. As discussões envolvem filosofia e semiótica (a ciência que estudo os sistemas de significação), necessárias quando se discute inteligência artificial, tendo em vista que para tentar recriar o pensamento humano temos que entender o que é o pensamento humano. Há também algumas referências culturais relativamente refinadas, como citações ao pintor contemporâneo Jackson Pollock e ao criador da bomba nuclear, Robert Oppenheimer.

O filme tem um cenário bastante simples, se passando quase que por completo na mansão meio subterrânea meio integrada à natureza de Nathan. Os efeitos visuais da criação do corpo de Ava são muito bem feitos. A música discreta casa-se perfeitamente ao tema, gerando um incômodo e uma tensão permanentes.

O elenco também acompanha essa simplicidade, com apenas 4 personagens, com grandes atuações. O protagonista, Domhnall Gleeson, é o que menos se destaca, mas não deixa a desejar. Seu antagonista, Oscar Isaac, surpreende no papel, compondo uma personagem muito enigmática. Vale lembrar que ambos estarão presentes no aguardado Star Wars: O Despertar da Força (que pretendo analisar aqui no dia do seu lançamento). E Alicia Vikander seduz e confunde a todos com seus belos e grandes olhos. Todos eles são estrelas em ascensão em Hollywood e vale guardar seus nomes (Vikander está cotada para uma indicação à atriz coadjuvante pelo futuro lançamento A Garota Dinamarquesa).

A direção do novato Alex Garland (que tem em seu currículo alguns roteiros, incluindo o deste filme) é bastante eficiente e extrai o máximo desse minimalismo de cenários e personagens. A edição também é bastante competente em manter a tensão permanente.

Ex Machina é um filme muito bom e merece ser visto por quem gosta de uma estória focando tema atual, uma boa trama e boas atuações. Até o momento, é a melhor produção em língua inglesa de 2015.


Nota: 8

3 de novembro de 2015

Ponte dos Espiões

Ponte dos Clichês Americanos

Bridge of Spies, Dir: Steven Spielberg, EUA, 2015, 141min
IMDB: clique aqui
Trailer: clique aqui


Em mais um filme da sua linha séria, o celebrado diretor Steven Spielberg conduz os espectadores ao conturbado período da Guerra Fria, e traz com ele, pela quarta vez, Tom Hanks como protagonista. O filme é baseado em uma história real muito interessante e é bem conduzido em boa parte. Contudo, o acúmulo dos exageros patrióticos do filme põe tudo a perder no final.

[Atualização: Na corrida do Oscar 2016 recebeu 6 indicações: filme, ator coadjuvante, roteiro original, design de produção trilha sonora e mixagem de som. Só tem chances em ator coadjuvante e design de produção (que são merecedoras de elogios), mas possivelmente não vai ganhar nada.]

No primeiro ato da trama, o advogado Jim Donovan (Tom Hanks) é requisitado para defender um espião soviético que agia em solo americano, Rudolf Abel (Mark Rylance). No segundo ato, após o processo em que ele consegue salvar seu cliente da pena de morte, ele é requisitado pela CIA para trocá-lo por um prisioneiro americano, um piloto abatido na URSS, Francis Powers (Austin Stowell), que estava em poder dos soviéticos.

De início já temos de relevar algumas patriotadas do filme. Como costuma ocorrer, há uma quase profissão de fé em torno do "american way of life" e do sistema legal do país (com direito a cena com as crianças prestando juramento patriótico em sala de aula, bastante desnecessária ao andamento da trama). Como a estória é boa e bem contada (até certa parte, que discutiremos em breve), dá pra aceitar tais exageros, já que não tomam tanto espaço.

A primeira cena é bastante interessante, parecendo se tratar de um filme europeu, pois faz uma longa tomada do espião russo, sem diálogos, só focando em pequenos gestos de sua rotina e o monitoramento que o FBI realiza sobre ele. A espionagem aqui passa longe dos delírios cinematográficos da linha James Bond/Ethan Hunt. 

A primeira parte tem diversos méritos, especialmente por discutir o papel do advogado de defesa no exercício da Justiça. Donovan passa a ser visto com desdém por boa parte da sociedade e sua posterior insistência em recorrer a Suprema Corte após já estar afastada a possiblidade de pena de morte passa a incomodar até mesmo seus sócios e sua família, que não entendem porque ir tão longe com esse caso. Tal construção é muito interessante, pois seria necessário que todos pudessem diferenciar o advogado do cliente que ele defende. Defender bandido não é ser bandido. Depois que vimos no Brasil advogados de réus célebres sendo agredidos na rua (leia a notícia aqui) é bom reforçar isso.

Na segunda parte, Donovan tem de fazer a troca de prisioneiros à margem dos contatos oficiais dos países, e aí os problemas do roteiro do filme começam a se agravar (provavelmente os brilhantes irmãos Joel e Ethan Cohen, que são corroteiristas, pararam por aí). Berlin Oriental provavelmente não era o melhor lugar do mundo para se viver no início dos anos 60, mas as cores são extremamente carregadas por Spielberg. Os soldados alemães orientais são retratados como um bando de trogloditas loucos para bater nos traidores do socialismo. E o maniqueísmo spielbergiano torna-se ainda mais evidente. Enquanto mostra o piloto americano sendo submetido a tortura psicológica pelos soviéticos, com privação de sono e água fria na cara, para revelar seus segredos, o soviético preso nos EUA é sempre mostrado com tratamento de primeiro mundo. Depois do que o mundo viu o que ocorreu em Guantánamo e Abu Ghraib, é quase impossível que o espectador bem informado acredite em tamanha benevolência dos americanos.

E no clímax do filme parece que estaciona na ponte da troca dos espiões um caminhão de clichês e despeja todo seu conteúdo. Os diálogos, as tomadas, o cenário, a música e as atuações, ou seja, todos os elementos, servem para compor o heroísmo de Donovan, servindo como metáfora dos EUA.

E o que já estava ruim fica ainda pior, pois Spielberg, em sua obsessão patológica por finais felizes, parece se ver obrigado a contar como é o retorno de Donovan para casa, o que poderia ser suprimido do filme e melhorado a obra. Tal final lembrou-me muito de A.I.: Inteligência Artificial, em cujo fim há uma cena linda, em que o pequeno andróide fica vivendo em uma esperança vã eterna. Se o filme terminasse ali seria uma grande obra. Mas Spielberg estraga a ideia original que tinha trabalhado com o genial Stanley Kubrick e inventa uma estória sem pé nem cabeça, em que tem que trazer aliens para a Terra (é isso mesmo!) e fazer a alegria do robozinho. [Errata: como fui corrigido por dois comentários, não eram ETs, mas robôs mais avançados. Peço desculpas pelo erro, mas não muda minha opinião sobre o final].

Apesar dos defeitos do cinema de Spielberg, é inegável a grande qualidade técnica de todos os filmes em que ele se envolve. A fotografia é discreta em muitos momentos, utilizando-se de muitos cenários escuros iluminados somente por luz que vem de uma janela. Nos momentos com maior ação sempre há câmeras em movimento. O design de produção é bem feito, com apuro nos detalhes. E a edição não cansa o espectador, especialmente com as pitadas de humor inseridas nos momentos corretos.


O filme conta com somente dois atores em papéis realmente importantes, os mencionados Hanks e Rylance [atualização: indicado ao Oscar de coadjuvante]. Hanks está em sua melhor atuação dramática desde Náufrago (e lá se vão 15 anos), e é quase certo que só seu nome já basta para lhe garantir uma indicação ao Oscar, já que ganhou a indicação até mesmo com sua atuação razoável em Capitão Philips (clique aqui para ler o pitaco). A produção até comete um erro de escalação ao colocar um ator de renome como Alan Alda em um papel quase que figurante e que nada acrescenta. Uma boa surpresa é ter o bom ator alemão Sebastian Koch, protagonista do ótimo A Vida dos Outros (clique aqui para ler o pitaco), no papel de um agente da Alemanha Oriental.


Tenho um profundo respeito por Spielberg, que revolucionou o cinema na virada entre os anos 70 e 80. Mas desde os anos 90, em que fez em sequência os celebrados Jurassic Park e A Lista de Schindler, não apresenta nenhum filme memorável. Aliás, revi recentemente esse último, e apesar de haver um herói relutante e um vilão nazista monstruoso, Spielberg conduz o filme de maneira muito mais séria e com a mão muito mais calibrada.

Apesar disso tudo, a chance da Academia ignorar toda essa patriotada (ou não só ignorar, como vibrar com todos esses exageros de endeusamento da nação) e incluir o filme em diversas categorias no próximo Oscar é quase certa, haja vista que outra patriotada maniqueísta como Sniper Americano (clique aqui para ler o pitaco) estava na lista de melhores filmes na última premiação [atualização: previsão confirmada].

Ponte dos Espiões tem todos os méritos técnicos dominados por Hollywood mas que desperdiça uma boa estória em meio a seu maniqueísmo e patriotismo exagerados. O que faz o espectador mais culto querer fugir cada vez mais de filmes de estúdio, já que parece que em todas as estórias contadas por eles é necessária a presença de um herói, e não de pessoas reais. A seriedade e o realismo passam longe.

Nota: 4