Banalidade do Mal
Idem, Dir: Margarethe von Trotta, Alemanha/França/Luxemburgo, 2012, 113 minIMDB: http://www.imdb.com/title/tt1674773/?ref_=sr_1
Hannah Arendt é considerada uma das maiores filósofas do século XX, sendo seu livro mais conhecido Origens do Totalitarismo, no qual causou grande polêmica ao comparar o nazismo ao stalinismo, vistos como duas faces da mesma moeda do totalitarismo.
O filme trata de um período posterior a este livro, quando ela vai, a serviço da revista The New Yorker, fazer a cobertura do julgamento do líder nazista Adolf Eichmann pelos israelenses. Eichmann era responsável pela logística de embarcar prisioneiros nos trens que seguiam para os campos de concentração, sendo que a morte destes prisioneiros, em sua maioria judeus, era quase uma certeza. Após a guerra, Eichmann conseguiu escapar da Alemanha e, anos depois, foi capturado pelo Mossad, o serviço secreto israelense em Buenos Aires, e levado a Jerusalém.
Todos esperavam então ver um monstro no tribunal, um nazista cruel sem o menor respeito à vida. Alguns viram o que esperavam, até porque o ódio despertado pelo genocídio ainda era muito recente. Mas Hannah Arendt tentou ver o homem, sem preconceitos, e ficou chocada ao perceber que ele não era nenhum monstro, mas um homem comum, um simples burocrata, que tinha a convicção de que apenas seguia ordens e que não tinha responsabilidade alguma pelas mortes das pessoas, pois, afinal, "somente as colocava dentro do trem".
Com isso, Arendt notou que diferentemente do que diz o senso comum, o Mal não é algo inato, um defeito de caráter ou algo do gênero. O Mal pode ser banal, como ela entendeu ao criar o conceito de "banalidade do mal". Eichmann era uma pessoa medíocre, não era nenhum gênio do mal ou um pervertido. Apenas abidicara de sua capacidade de discernir entre o que é certo e o que é errado, o que, para Arendt, é a característica masi marcante no pensamento humano.
Como toda ideia que fere o senso comum, esta causou polêmica, da mesma maneira que há poucos anos causou o excelente filme A Queda: As Últimas Horas de Hitler ao humanizar a figura do fuhrer. É muito mais fácil para o senso comum entender que Hitler era simplesmente um monstro sádico do que entender que ele era um homem comum que cometeu uma série de atrocidades, e que nós também podemos fazer o mesmo, pois, afinal, o "monstro" reside em nós.
Mas a maior revolta foi causada pela sua coragem em querer analisar o papel de alguns líderes judeus que colaboraram com os nazistas na organização do sistema. Esse foi o fator para que muitos até jurassem Arendt de morte e a considerassem uma traidora, pois ela era judia e até mesmo passara por um campo de concentração. Há muito de interesse político aí, pois a própria existência do Estado de Israel se deve em grande parte ao genocídio nazista e a ideia de martirização do povo judeu. Se se ataca tal martirização fica difícil justificar o sionismo, ou seja, a necessidade da existência de um Estado próprio em que o povo judeu possa viver sob suas leis.
O filme é um pouco "quadrado". Há uma certa repetição de "cenas reflexivas" de Arendt, com ela pensando com expressão séria ao lado de seus inseparáveis cigarros enquanto ouvimos uma música dramática tocada bem alto. Tecnicamente o que há de mais interessante é o fato de que Eichmann é interpretado por ele mesmo, ou seja, são usadas imagens reais de seu julgamento e de suas frases, o que nos permite julgar diretamente sobre o réu.
Mas o que sustenta o filme são as ideias de Arendt e sua coragem em expor suas polêmicas ideias. Como certeza muita conversa será gerada após a sessão.
Aliás, seguem duas ótimas colunas sobre Eichmann e Arendt, dos psicanalistas Contardo Calligaris e Francisco Daudt:
Nota: 7