22 de março de 2016

As Sufragistas

As Sofredoras

Suffragette, Dir: Sarah Gravon, Reino Unido, 2015, 1h46min
IMDB         Trailer


Um tema pode ser muito nobre, mas a forma de ser mostrado pode estragar tudo. Esse é o caso de As Sufragistas, filme que conta a história das mulheres que lutaram pelo direito ao voto feminino na Inglaterra do início do século XX. Causa mais do que nobre, mas com todos os elementos cinematográficos fora do lugar. 

A trama acompanha a trajetória de uma empregada de uma lavanderia, Maud Watts, a princípio pouco engajada na luta feminina, mas que aos poucos se envolve na causa e se torna uma das líderes do movimento sufragista. 

Essa escolha pelo foco em uma só personagem de trajetória (mega) sofrida já indica o dramalhão que será apresentado na tela. Desnecessário esse foco no drama pessoal, que chega até a despolitizar o filme na medida em que mais importante é o sofrimento imposto à personagem do que a discussão sobre a causa pela qual ela luta. Fica parecendo as toscas novelas da Gloria Perez, sempre com temas ótimos a serem explorados mas que preferem focar na choradeira da mocinha. 

Há doses cavalares de maniqueísmo ao criar uma série de homens sádicos e desumanos. O chefe da heroína é um monstro perfeito: só quer que as funcionárias lhe deem lucro e saciem suas taras. A polícia também exerce papel de vilã ao ser apresentada como um grupo "que quer acabar com essas folgadas" (Muahahaha!).  O marido da mocinha é um banana sem muita opinião que quer somente obedecer as convenções sociais. Só há um personagem bem construído na estória que é o chefe da inteligência da polícia, que não age por ódio e mostra respeito pelas sufragistas, e só as persegue porque é seu trabalho. Obviamente existia e ainda existe opressão contra as mulheres, mas o filme chega a quase generalizar tal opressão.

A crítica que faço aqui é a mesma que fiz a filmes como Sniper Americano ou Ponte dos Espiões, pois também não acho que todos os combatentes iraquianos ou que todos os burocratas soviéticos eram sádicos. As Sufragistas segue essa mesma linha ao contar a história de uma heroína contra monstros, não uma luta entre humanos. Em oposição a esses filmes temos boas obras como 12 anos de Escravidão, em que não foi desnecessário se desumanizar o "sinhô", pelo contrário, ele é mostrado como um homem complexo mas extremamente passional, cujo sistema podre me que estava inserido permitiu que extravasasse sua fúria sobre outros. O mesmo se pode dizer do vencedor do Oscar Spotlight em que a culpa dos crimes da igreja é dividida com toda a sociedade bostoniana, sem demonizar os personagens.

Com um roteiro desses não se pode esperar muito das atuações. Carey Mulligan é boa atriz, mas nesse papel de heroína sofredora não poderia esperar ser lembrada em premiações relevantes. A situação é tão complicada que até Meryl Streep pareceu forçada na sua minúscula participação como a líder maior das sufragistas e em sua fuga da polícia ela arruma tempo para dar um conselho a heroína ainda novata na causa. Cena lamentável. Somente Brendan Gleeson merece elogios por seu trabalho como o chefe da inteligência, até por ser o único personagem mais complexo. 

Como dito, tecnicamente o filme também é um fracasso. A fotografia peca não pela escolha da paleta de cores escura ou pela iluminação fraca, mas pelos planos fechados em excesso e pelas câmeras tremidas sem qualquer função narrativa. A edição ainda piora isso e as cenas de ação são muito ruins, tão recortadas que mal dá pra acompanhar o que está acontecendo com quem. A música também é muito exagerada, caindo nos mesmos clichês narrativos que critiquei no mencionado Ponte dos Espiões.

Não conheço nada do trabalho anterior da diretora Sarah Gavon, mas a roteirista Abi Morgan assinou Shame, um filme bom e ousado, sobre um cara viciado em sexo. Impressionante como ela pode apresentar trabalhos com qualidade tão diversas.

As Sufragistas é filme péssimo porque ele usa os típicos clichês de heroísmo dos grandes filmes de estúdio hollywoodianos e é fraco tecnicamente. Melhores são os filmes mais cinzentos (desde que não os limitem a 50 tons!).

Nota: 2

Nenhum comentário :

Postar um comentário

Dê o seu pitaco