1 de agosto de 2017

Dunkirk

Encurralados 

Dir: Christopher Nolan, Reino Unido e outros, 2017, 1h46min
IMDB                 Trailer     


Adrenalina pura. É isso que entrega um dos principais lançamentos do ano, Dunkirk.

Prova de que o filme está apoiado na tensão é o fato de que se poderia contar todos os spoilers que não estragariam nada (mas relaxem que aqui não terá spoilers). A tensão no espectador não reduziria em saber o que vai acontecer. O foco aqui é a ação.

O filme retrata o desfecho do baile tático que os exércitos alemães impuseram aos aliados na 2ª Guerra Mundial, cercando-os contra o mar próximos à fronteira franco-belga na cidade de Dunquerque (aliás, o título nacional poderia ter usado a grafia em português do nome da cidade, como fizeram os países francófonos e hispanófonos).

A trama é pouco importante, assim como seus personagens que não tem nenhum desenvolvimento significativo. E isso não se deve a desleixo de roteiro, mas é intencional. Importante observar isso, pois critiquei muito Rogue One especialmente pela falta de empatia dos personagens. A diferença é que ao contrário de Dunkirk, o spin-off de Star Wars quis criar personagens que cativassem o público, mas falhou.

O diretor e roteirista Christopher Nolan não quer particularizar nenhuma história, mas mostrar diversos homens (e algumas mulheres fazendo figuração) tentando sobreviver em meio ao caos. Não há espaço para histórias de amor, como o patético Pearl Harbor, ou para sentimentalismos como no ótimo O Resgate do Soldado Ryan. Aqui há a brutalidade da guerra, e, diferentemente de títulos do gênero, sem sanguinolência e sem americanos. Também os vilões não são personificados, nenhum rosto alemão é mostrado. Temos mais medo do que não vemos. Basta lembrar de o quanto Tubarão é assustador, em que o peixe assassino só "dá as caras" ao final do filme. 

O filme é intenso ininterruptamente ao longo de suas quase duas horas. Se a cena inicial de O Resgate do Soldado Ryan ainda hoje impressiona com seus 27 minutos de batalha, aqui, após o primeiro tiro disparado em menos de um minuto de projeção, a batalha prolonga-se por todo o filme. Batalha, aliás, é um nome impróprio, pois é uma fuga sob pesado fogo inimigo, em que quase que um lado só ataca.

O ponto negativo na estrutura é o tempo que é um pouco confuso. Já no início os créditos indicam que em terra o tempo foi de uma semana, no mar foi de um dia e no ar de uma hora. Essas três tramas temporais de compassos completamente diversos correm em paralelo, se encontrando ao final. A costura é até bem feita, mas em alguns momentos cenas já mostradas são exibidas de um ponto de vista diverso, gerando uma dúvida se a cena é nova ou se realmente é aquela já vista.

Os combates aéreos são os melhores já vistos no cinema, superando o clássico Top Gun. As cenas que mostram os ataques dos célebres caças de mergulho Stuka nos fazem entender o porquê esses aviões eram tão temidos pelas tropas inimigas.

Em um filme com personagens sem grande importância, as atuações também não causam impacto, apesar de alguns nomes de destaque no elenco. Curioso notar que o papel que Nolan costuma reservar a Michael Caine, o do tiozão que explicará didaticamente o plano e o cenário, aqui fica para Kenneth Branagh, vivendo o comandante da marinha que conta ao espectador o que o alto comando britânico planeja. E Tom Hardy segue sendo melhor ator de máscara do que de cara limpa.

Nolan, apesar de estar longe de ser o maior diretor de todos os tempos, como querem seus fan-boys, é um dos maiores realizadores do cinema atual. Um diretor pode ser considerado bem sucedido quando consegue fazer com que o espectador sinta o que ele deseja. E isso ele faz com maestria, levando o público para a retirada da Operação Dínamo.

A trilha sonora do mestre alemão Hans Zimmer impressiona. Os sons de um crescendo que nunca se realizam acompanhados por um tique taque incessante provocam profunda angústia no espectador. Não há respiro ou baixa de adrenalina ao longo da projeção. Aliás, não só a trilha sonora é boa, todo o som desse filme é exemplar, uma aula de quanto o som pode mexer com a platéia. 

A cinematografia é arrebatadora. Isso em um cenário um tanto monótono, em que só há uma praia comum, céu, mar e alguns barcos e aviões. Pontos para o ótimo diretor de fotografia suíço Hoyte Van Hoytema, que tem vários belos filmes no currículo e deve receber sua primeira indicação ao Oscar com esse trabalho.

Falando no prêmio da Academia, o filme está largando na frente na corrida para ser o campeão em prêmios da próxima edição, resta saber se não perderá força até março. Certamente receberá diversas indicações nas categorias técnicas (e vencerá várias), assim como também deve receber indicações de direção e melhor filme. Conta a favor o fato da Academia estar querendo dar o prêmio principal para uma produção grande e assim agradar público e estúdios, e não só a crítica, coisa que não ocorre desde a vitória de O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei em 2004.

Dunkirk é uma experiência cinematográfica única, apoiado por sua excelência visual e sonora e por sua narrativa pouco convencional em filmes do gênero. Um raro filme que consegue ser tanto um blockbuster de verão recheado de explosões quanto um filme de arte. Um tipo de filme que se perdeu ao longo dos anos.

Nota: 9